Assembleia Legislativa debate ações integradas para fortalecer políticas de enfrentamento à violência contra a mulher no Paraná
Audiência foi promovida pela deputada Cantora Mara Lima (Republicanos), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher. A Assembleia
Audiência foi promovida pela deputada Cantora Mara Lima (Republicanos), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher.
A Assembleia Legislativa do Paraná realizou, na manhã desta terça-feira (25), a audiência pública sobre a Eliminação da Violência Contra a Mulher, em que foram debatidas as políticas públicas já vigentes ou que possam ser criadas para contribuir para a redução das tristes estatísticas da violência de gênero que assolam o estado e o país. O encontro, promovido pela deputada Cantora Mara Lima (Republicanos), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, reuniu autoridades judiciais, especialistas em segurança pública, representantes de instituições que atuam diretamente no enfrentamento da violência e na garantia de direitos, além de vítimas que conseguiram se libertar de relações tóxicas com seus agressores.
A audiência pública marca o Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher, celebrado hoje, e lança luz sobre um tema que afeta milhares de mulheres em todo o país. De acordo com o Ministério das Mulheres, somente entre janeiro e outubro deste ano, a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 registrou 126.455 denúncias de violência contra mulheres, uma média de 417 casos por dia. Dessas denúncias, 66% foram feitas pela própria vítima, 21% de forma anônima e 13% por terceiros.
“É algo pelo qual a gente luta: o fim da violência contra a mulher. Uma violência muitas vezes silenciosa, em que as pessoas não querem ‘colocar a colher’, mas que precisa ser discutida. Porque aqueles que silenciam, de alguma forma, também se tornam violentos, porque o silêncio constrange e deixa as pessoas ainda mais vulneráveis. A violência contra a mulher já virou uma pandemia mundial. As mulheres estão morrendo — vamos falar bem claro — e nós ainda não conseguimos chegar a uma solução. Conseguimos tantas coisas, mas não conseguimos impedir que matem nossas mulheres. E muitas vezes por motivos tão banais. O pior de tudo é que, em grande parte dos casos, a violência ocorre na presença de alguém: 70% dos casos acontecem na presença de crianças e familiares, e isso acaba desencadeando uma nova geração que pode se tornar também violenta. O que precisamos, em audiências públicas como esta, é trazer as pessoas para falar; hoje temos algumas vítimas aqui para relatar a realidade”, afirma a deputada.
Ela defende que o tema seja cada vez mais debatido na sociedade, para que se encontre o caminho para pôr fim a essa violência. Os dados mais recentes mostram que quatro mulheres são vítimas de feminicídio por dia no Brasil, número que comprova a urgência de políticas efetivas de prevenção a novos casos.
O deputado Professor Lemos (PT) destacou o papel da Assembleia na elaboração de leis que garantem proteção às vítimas dessa forma de violência.
“Nós tivemos a oportunidade de construir, com a deputada Cantora Mara Lima e com as demais deputadas, leis como a que instituiu a Lei Maria da Penha aqui no Paraná. Depois, fomos até o governador para garantir sua implementação, com a Polícia Militar, em todo o estado. E também aprovamos o programa Maria da Penha Vai à Escola, para prevenir, por meio da educação, futuros casos de violência contra a mulher, entre outras leis”, destaca.
Um dos pilares do combate à violência contra a mulher é a aplicação das penas previstas em lei para os agressores. A desembargadora Cristiane Tereza Willy, responsável pela Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (CEVID) do Tribunal de Justiça do Paraná, falou sobre os desafios e os avanços alcançados no enfrentamento à violência.
“A violência contra a mulher, especialmente no âmbito doméstico e familiar, é histórica. Acompanha as mulheres há milhares de anos e, graças a Deus, hoje temos uma cultura voltada a abolir isso — e abolir por meio da educação e da punição. Enquanto o Poder Judiciário atua com os processos judiciais e com a punição, muito do cumprimento da pena já tem uma visão mais humanizada, por meio dos grupos reflexivos para homens autores de violência, para reavaliar, reconstruir e trabalhar os estereótipos e a cultura do machismo. Assim, a penalização hoje também tem esse aspecto educativo, para reconstruir valores e promover uma nova forma de ser, para homens e mulheres, com a aceitação de que os homens devem dividir responsabilidades. As mulheres querem seu espaço, mas não querem tirar o espaço de ninguém; querem caminhar lado a lado, com respeito”, explica.
A desembargadora também destaca a importância da educação para evitar que a cultura da violência seja transmitida às próximas gerações.
“Outra frente de atuação é junto aos jovens, por meio da educação. Temos programas no Estado, tanto do Executivo quanto do Judiciário, voltados aos alunos da rede pública, com o objetivo de trabalhar o conceito da não violência e da cultura de paz no ambiente familiar, para buscar erradicar a violência contra a mulher e a violência de gênero”, complementa.
Para os casos de violência já consumada, a magistrada apontou os caminhos disponíveis para denúncia. “Em Curitiba, temos a Casa da Mulher Paranaense. No interior, quando não houver delegacia especializada, as delegacias comuns também recebem as denúncias. Além disso, a Defensoria Pública mantém em sua página o Programa Luna, que recebe notificações para prestar assistência jurídica qualificada às mulheres. As escolas também estão sendo orientadas a encaminhar alunos que apresentem indícios de violência no lar aos psicólogos do CRAS para avaliações. Estamos começando a viver uma nova era”, conclui.
Violência contra a mulher afeta toda a sociedade
As ações efetivas do poder público no combate à violência de gênero são fundamentais para a formação de uma sociedade mais justa e igualitária, de acordo com Mariana de Sousa Machado Neris, diretora de Políticas Públicas para as Mulheres da Secretaria da Mulher, Igualdade Racial e Pessoa Idosa (SEMIPI) do Paraná.
“O Dia Internacional de Eliminação da Violência contra as Mulheres acontece hoje e estamos aqui, nesta audiência pública, para relembrar todo o histórico de violência que as mulheres vêm sofrendo e os danos que isso causa no dia a dia. Quando as mulheres sofrem violência, elas não sofrem sozinhas. Os filhos e todas as pessoas ao redor também são impactados — inclusive no trabalho e na rotina. Debater a eliminação da violência é extremamente importante não só para o Executivo, mas também para o Legislativo, o Judiciário e toda a sociedade, porque eliminar a violência precisa ser um compromisso de todos. E isso passa por políticas públicas de prevenção e proteção da mulher”, afirma.
A audiência pública foi encerrada com o relato corajoso da ex-jogadora e atual treinadora de vôlei Daniela Leal dos Santos, vítima de agressões constantes ao longo de um casamento de 17 anos, que contou como conseguiu se libertar do relacionamento abusivo.
“Acho fundamental participar dessa audiência e poder dizer a outras mulheres que elas são capazes de recomeçar. Não é normal sofrer qualquer tipo de abuso ou violência, seja emocional, física ou de qualquer natureza. Precisamos nos posicionar como mulheres e saber que existe uma vida lá fora. Eu costumo dizer que é como uma escravidão, como se estivéssemos aprisionadas e não conseguíssemos enxergar. Estou aqui para incentivar e dizer que é possível recomeçar”, destaca, lembrando que é muito difícil quebrar o ciclo da violência.
“Hoje estou aqui curada, como a gente costuma dizer. E parece tão fácil, parece até que nunca aconteceu. Eu fiquei dezessete anos casada — é bastante tempo até começar a enxergar. O bom é que minha família me apoiou muito. Em determinado momento, eles disseram que aquilo não era normal, que eu estava sofrendo. Sua mãe, seus irmãos, seus filhos veem você sofrer. Chegou uma hora em que parece que eu despertei. Acordei um dia e não estava mais cega; era como se escamas tivessem caído dos meus olhos. E acredito que essa frase de que ‘em briga de marido e mulher ninguém mete a colher’ contribui para que muitas mulheres, assim como eu, vivam anos em relacionamentos tóxicos”, relata.
Daniela também destacou a importância de as mulheres conhecerem seus direitos e os canais para denunciar os agressores, além do papel dos órgãos públicos no acolhimento e proteção às vítimas.
“As pessoas precisam perceber que a vítima precisa de ajuda. Principalmente mães com filhos — no meu caso, tenho três. É muito fácil dizer que é só se separar, mas e depois? Como fica? Venho de uma família com juiz, advogado, tinha total conhecimento dos meus direitos, mas o apoio é fundamental. Quando a minha família resolveu ‘meter a colher’, minhas amigas, as pessoas com quem joguei, eu realmente acordei. Quando a Lei Maria da Penha passou a ser mais debatida, essa repercussão também ajudou. E um dia a gente toma coragem, liga para o 180 e vê que dá certo, que podemos contar com esse apoio — da Guarda Municipal, da Polícia, da medida protetiva da Justiça. Não é fácil, é um passo de cada vez, mas depois vemos que, buscando nossos direitos, conseguimos”, finaliza.
A audiência pública contou ainda com a presença da promotora Ticiane Louise Santana Pereira, da 5ª Promotoria de Justiça de Crimes Dolosos Contra a Vida do Ministério Público do Paraná; da guarda municipal Gislaine Aparecida Seneiko Szumski, que atua há mais de uma década na Patrulha Maria da Penha de Curitiba; de Paula Feitosa, coordenadora da Unidade de Acolhimento Institucional/Abrigo Pousada de Maria; e do coronel Dalton Gean Perovano, coordenador do Centro de Políticas de Proteção a Minorias e Grupos Vulneráveis da Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná.(ALEP).
